sexta-feira, 27 de outubro de 2017

História, conceito e tipos de deficiência
                                                                                                         Izabel Maior
             A deficiência é um conceito em evolução, de caráter multidimensional e o envolvimento da pessoa com deficiência na vida comunitária depende de a sociedade assumir sua responsabilidade no processo de inclusão, visto que a deficiência é uma construção social. Esse novo conceito não se limita ao atributo biológico, pois se refere à interação entre a pessoa e as barreiras ou os elementos facilitadores existentes nas atitudes e na provisão de acessibilidade e de tecnologia assistiva. Em outras palavras, o conceito de pessoa com deficiência que consta na Convenção supera as legislações tradicionais que normalmente enfocam o aspecto clínico da deficiência. As limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais passam a ser consideradas atributos das pessoas, atributos esses que podem ou não gerar restrições para o exercício dos direitos, dependendo 3 das barreiras sociais ou culturais que se imponham aos cidadãos com tais limitações (FONSECA, 2007).
                                           “Deficiências e Diferenças”. 
              Ao não valorizar a diferença, atribuímos rótulos às pessoas, que muitas vezes as inferiorizam, destacando apenas um de seus atributos e nem sempre de forma elogiosa. Elas são identificadas e reduzidas a uma única característica. Assim, a exclusão é imposta por uma sociedade supostamente feita para pessoas “normais” – seja lá o que isso quer dizer…
             Ao longo da História – e até hoje – pessoas com deficiência têm sido segregadas, discriminadas, isoladas. Também foram aceitas e ocuparam cargos e funções nos seus grupos. Sobreviveram a guerras, a preconceitos e a catástrofes naturais. A tecnologia tem sido uma aliada importante, abrindo possibilidades até então inimaginadas; os Direitos Humanos inspiraram leis, princípios e posturas de aceitação e, mais do que isso, de valorização do outro como ele é.
            Portanto, a deficiência é relacional, como definiu Izabel, com precisão; ela não é o aspecto biológico, mas sim o resultado da interação indivíduo/sociedade.




###Logo que fui nomeada no Estado há dezessete anos, tive a experiência de receber por algumas semanas um aluno surdo e mudo na segunda série, foram semanas pois mudou-se de cidade em seguida. Pra mim foi assustador, porque não tinha experiência, não sabia a língua dos sinais, a escola também não tinha nenhuma estratégia para ajudar a criança e a mim. Me senti totalmente perdida, e muito mal, pois via aqueles olhinhos me olhando esperando algo de mim, da escola e eu tentava por gestos me comunicar de alguma maneira com ele. Foi um experiência de impotência.
                                                MÉTODO CLINICO PIAGETIANO

Quando Piaget inicia suas investigações sobre o pensamento infantil, havia uma concepção rígida sobre o sistema de avaliar e classificar os níveis de inteligência das crianças (BAMPI, 2006) e isto inquietou o pesquisador suíço, levando-o a desenvolver um método de pesquisa peculiar, que foi caracterizado e nomeado por ele de Método Clínico.
O método piagetiano é clínico no sentido de ir além do óbvio, da resposta estereotipada, buscando compreender o ponto de vista da análise do sujeito. As características gerais das explicações, a maneira como o indivíduo resolve os problemas apresentados, como chega às suas explicações, buscando também perceber se guarda coerência, se manifesta contradições, e também, de forma mais peculiar, o que há de criatividade nas respostas, mas, ainda assim, sem afastar-se do sujeito epistêmico.
As pesquisas de Jean Piaget estavam voltadas para o estudo da gênese e das estruturas do conhecimento. A indagação sobre como o ser humano constrói seu conhecimento acerca do mundo, saindo de um estágio de inteligência inferior para outro superior, movimentou seus interesses de pesquisa, culminando na estruturação da teoria da Epistemologia Genética.
Segundo o próprio Piaget (1926/1982), trata-se de um método misto, uma vez que resume elementos da observação, da experimentação e de testes ou questionários abertos: [...] consiste sempre em conversar livremente com o sujeito, em vez de limitá-lo às questões fixas e padronizadas. Ele conserva assim, todas as vantagens de uma conversação adaptada a cada criança e destinada a permitir-lhe o máximo possível de tomada de consciência e de formulação de suas próprias atitudes mentais (p. 176).
Piaget (1985, p. 51) reafirma o resultado do seu trabalho baseado em pesquisas:
Cinqüenta anos de experiências fizeram-nos saber que não existem conhecimentos resultantes de um registro simples de observações, sem uma estruturação devida às atividades do sujeito. Mas também não existem (no homem) estruturas cognitivas a priori ou inatas: só o funcionamento da inteligência é hereditário e só engendra estruturas por uma organização de ações sucessivas exercidas sobre objetos. Daqui resulta que uma epistemologia conforme com os dados da psicogênese não poderia ser nem empirista nem pré-formista, mas consiste apenas num construtivismo, com a elaboração contínua de operações e de estruturas novas. 0 problema central é, então, compreender como se efetuam estas criações e por que razão, visto resultarem de construções não pré-determinadas, se podem tomar logicamente necessárias, durante o desenvolvimento.


sexta-feira, 20 de outubro de 2017

quinta-feira, 5 de outubro de 2017


Formação e atuação dos professores: dos seus fundamentos éticos
Como o processo educativo ocorre paralelamente ao desenvolvimento contínuo de um sujeito por um lado conectado a comportamentos e atitudes cristalizados na cultura e, por outro, relacionado pela consciência crítica a ideais de liberdade e cidadania, cada educador em formação, mergulhado em incertezas, necessita construir instrumentos próprios que lhe possibilitem subsídios para lidar com o seu universo educacional de maneira verídica e producente, dialogando com as interrogações que se impõem a cada dia, e, ao mesmo tempo, desenvolver uma nova consciência de pertença a um todo integrador das várias nuanças que compõem o tecido social, onde se inclui a educação.

Ora, a educação é uma modalidade de ação intrinsecamente relacionada à existência do outro. E uma prática que, por sua natureza, pressupõe uma intervenção sistemática na condição do outro. Em sendo uma prática interventiva, traz em seu próprio processo um risco muito grande de atingir a identidade e a dignidade do outro. Por isso mesmo, ela é lugar onde se faz ainda mais necessária a postura ética, tal o potencial que tem de agredir a dignidade do outro, dos educandos.
O homem como ser social, está diuturnamente partilhando experiências e relações com os seus semelhantes, pois somente adquire a humanidade quando imerso na vida gregária. Essa associação se efetiva por meio das relações pessoais, coletivas e de trabalho as quais são sedimentadas em meio a um universo próprio à comunidade a qual está inserido, e, portanto, são permeadas pelas peculiaridades de seu tempo histórico. As relações são partilhadas por indivíduos semelhantes, mas com características subjetivas, políticas, econômicas e culturais as mais diversas; são contextuais. Cada um com seus interesses, suas aspirações, seus desejos, suas paixões e suas razões. Há, desse modo, a necessidade de mecanismos de orientação e regulação da forma de os sujeitos estarem em sociedade no intuito de contribuir com uma convivência respeitosa e pacífica. “A ética se instaura no âmbito dessa ambigüidade, reconhecendo, por um lado, a fragilidade do humano com suas paixões e, por outro, a tentativa permanente de construir normas que regulem a convivência humana para além da particularidade [...]” (HERMANN, 2001, p.11).
Severino (2007, p. 193) enfatiza que “a ética contemporânea entende que o sujeito se encontra sob as injunções da história que até certo ponto o conduz, mas que é também constituída por ele, por meio de sua prática efetiva” . Está inscrita não na natureza ou essência humana, como foi entendida em outras épocas, mas no caráter social e histórico, na dimensão coletiva e política da existência dos indivíduos, pois a “ação do sujeito não pode mais ser vista e avaliada fora da relação social coletiva” (idem, p. 193).
Destaca-se como um desafio da escola e do docente, fazer com que os alunos se percebam e comportem-se como membros de uma comunidade. O ambiente escolar é eminentemente coletivo e possui cultura e dinâmicas próprias, cujas características se fundam no diálogo de seus sujeitos em interface entre a tradição educacional e as inovações cada vez mais exigidas nos contextos contemporâneos; constitui-se em espaço privilegiado para esse exercício.


A ação educativa escolar não é um fazer por fazer, mas um fazer intencional. Tratase da intencionalidade de um coletivo de sujeitos. Essa intencionalidade coletiva, porém, é impossível de ser construída sem que haja um mínimo de clareza teórica no nível dos sujeitos participantes, isto é, sem que os envolvidos nessa construção saibam dar as razões que motivam suas práticas. (BOUFLEUER, 2001, p.10)
                                          CROCODILOS E AVESTRUZES
             Ligia Amaral apresenta de maneira muito hábil suas reflexões, posicionamentos e inquietações pertinentes ao espaço das diferenças/deficiências, salientando a importância de o leitor ser informado a respeito do lugar de onde ela fala, esclarecendo que falar de algo interno a si próprio amplia a validade e significação do discurso.
          Como ponto de partida, Ligia Amaral torna urgente, ao tratar do termo diferença, primeiramente, seu esforço no sentido de colocar sob os holofotes aquilo que apreende como diferença em seus textos, visto que esta pode fazer referencia a inúmeras manifestações/estados/coisas.
           Então, pontua que a diferença a que se refere é a “diferença física”, aquela que pode ser “absorvida” pelo olhar do outro, enfatizando a amplitude desta idéia, fazendo-nos pensar a respeito de tão vasto é esse contexto, utilizando como exemplos de diferenças físicas o obeso, o baixo, o negro, aquele que utiliza óculos, o surdo, o cego, o paraplégico etc. No entanto, evidencia que o lugar da diferença, inegavelmente, é o corpo. (AMARAL, 1998)
            Debruçando sobre essa construção conceitual, intencionando enveredar por caminhos mais significativos e relevantes, mas não menos tortuosos, a autora apresenta o conceito de “significativamente diferente” ou “diferença significativa” como sinônimo de deficiente/deficiência.
            A diferença pode ser construída negativamente – por meio da exclusão ou da marginalização daquelas pessoas que são definidas como “outros” (...) Por outro lado, ela pode ser celebrada como fonte de diversidade, heterogeneidade e hibridismo, sendo vista como enriquecedora: é o caso dos movimentos sociais que buscam resgatar as identidades sexuais dos constrangimentos da norma e celebrar a diferença. (WOODWARD, 2000, p.50).
           Para Amaral (1998) mediante manifesta diversidade, e considerando sua proclamada legitimidade, o pensamento a respeito da diferença significativa ou deficiência, possivelmente, encontrará uma nova mentalidade. A autora revela, desta maneira, uma das idéias nucleares desse caminho tortuoso, que pode nos levar, não somente a entender, respeitar e aceitar o “outro”, mas, e principalmente, se colocar no papel do “outro” ou permitir ao “outro” ser “eu”, assim
          O preconceito é uma construção conceitual estabelecida anteriormente à nossa experiência. Constituindo duas dimensões principais: uma é a atitude, definida a partir de nossas predisposições psíquicas favoráveis ou desfavoráveis (para o nosso discurso, desfavorável) em relação a algo ou alguém, sendo seus conteúdos emocionais a admiração, medo, raiva, repulsa, amor, ódio etc; agindo com filtro para nossas interpretações e percepções. E a segunda dimensão trata do desconhecimento, o qual deriva da desinformação dos fatos ou sentimentos/emoções não elaborados. (AMARAL, 1998).
       Conclusivamente, externamos a necessidade de sairmos da posição de avestruzes, transformando nossos pensamentos e anseios em objetivações, em ações práticas que se materializem no dia-a-dia, utilizando as pontes movediças do conhecimento teórico-científico para transitar de maneira segura pelo rio das relações intra e interpessoais, que estão repletas de crocodilos que levam a tonalidade e o peso do preconceito, do estereótipo e do estigma.

           As metáforas dos crocodilos e avestruzes utilizadas pela autora nos remetem à complexidade do momento atual, no qual as relações humanas evidenciam  crises, embates e a falta de respostas para a diversidade e para as diferenças. Ainda vislumbramos ou mesmo tateamos estratégias e modos de conduta ética para lidar com esta realidade e percebemos que esta preocupação tem sido crescente na formação de pessoas voltadas às relações humanas, como é o nosso caso.