CROCODILOS E
AVESTRUZES
Ligia Amaral apresenta de maneira muito hábil
suas reflexões, posicionamentos e inquietações pertinentes ao espaço das
diferenças/deficiências, salientando a importância de o leitor ser informado a
respeito do lugar de onde ela fala, esclarecendo que falar de algo interno a si
próprio amplia a validade e significação do discurso.
Como ponto de partida, Ligia Amaral
torna urgente, ao tratar do termo diferença, primeiramente, seu esforço no
sentido de colocar sob os holofotes aquilo que apreende como diferença em seus
textos, visto que esta pode fazer referencia a inúmeras
manifestações/estados/coisas.
Então, pontua que a diferença a que se refere
é a “diferença física”, aquela que pode ser “absorvida” pelo olhar do outro,
enfatizando a amplitude desta idéia, fazendo-nos pensar a respeito de tão vasto
é esse contexto, utilizando como exemplos de diferenças físicas o obeso, o
baixo, o negro, aquele que utiliza óculos, o surdo, o cego, o paraplégico etc.
No entanto, evidencia que o lugar da diferença, inegavelmente, é o corpo.
(AMARAL, 1998)
Debruçando sobre essa construção conceitual,
intencionando enveredar por caminhos mais significativos e relevantes, mas não
menos tortuosos, a autora apresenta o conceito de “significativamente
diferente” ou “diferença significativa” como sinônimo de
deficiente/deficiência.
A diferença pode ser
construída negativamente – por meio da exclusão ou da marginalização daquelas
pessoas que são definidas como “outros” (...) Por outro lado, ela pode ser
celebrada como fonte de diversidade, heterogeneidade e hibridismo, sendo vista
como enriquecedora: é o caso dos movimentos sociais que buscam resgatar as
identidades sexuais dos constrangimentos da norma e celebrar a diferença.
(WOODWARD, 2000, p.50).
Para Amaral (1998) mediante
manifesta diversidade, e considerando sua proclamada legitimidade, o pensamento
a respeito da diferença significativa ou deficiência, possivelmente, encontrará
uma nova mentalidade. A autora revela, desta maneira, uma das idéias nucleares
desse caminho tortuoso, que pode nos levar, não somente a entender, respeitar e
aceitar o “outro”, mas, e principalmente, se colocar no papel do “outro” ou
permitir ao “outro” ser “eu”, assim
O preconceito é uma construção
conceitual estabelecida anteriormente à nossa experiência. Constituindo duas
dimensões principais: uma é a atitude, definida a partir de nossas
predisposições psíquicas favoráveis ou desfavoráveis (para o nosso discurso,
desfavorável) em relação a algo ou alguém, sendo seus conteúdos emocionais a
admiração, medo, raiva, repulsa, amor, ódio etc; agindo com filtro para nossas
interpretações e percepções. E a segunda dimensão trata do desconhecimento, o
qual deriva da desinformação dos fatos ou sentimentos/emoções não elaborados.
(AMARAL, 1998).
Conclusivamente, externamos a necessidade
de sairmos da posição de avestruzes, transformando nossos pensamentos e anseios
em objetivações, em ações práticas que se materializem no dia-a-dia, utilizando
as pontes movediças do conhecimento teórico-científico para transitar de
maneira segura pelo rio das relações intra e interpessoais, que estão repletas
de crocodilos que levam a tonalidade e o peso do preconceito, do estereótipo e
do estigma.
As metáforas dos crocodilos e
avestruzes utilizadas pela autora nos remetem à complexidade do momento atual,
no qual as relações humanas evidenciam crises, embates e a falta de respostas
para a diversidade e para as diferenças. Ainda vislumbramos ou mesmo tateamos
estratégias e modos de conduta ética para lidar com esta realidade e percebemos
que esta preocupação tem sido crescente na formação de pessoas voltadas às
relações humanas, como é o nosso caso.
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